X.
é vítima. De um estupro coletivo. Do linchamento público. E, desde o
dia 31 de julho de 2013, de um sistema que não consegue preservar uma
geração de jovens cariocas de uma adolescência marcada pela violência.
Um coquetel em que se misturam a situação de vulnerabilidade social, o
avanço no uso de drogas em áreas dominadas pelo tráfico e a falta de
estrutura do estado para cuidar de uma legião de adolescentes.
Em
julho de 2013, um relato enviado ao Disque Denúncia já conta a história
de X. Não estudava. Não conseguia cuidar do filho, recém-nascido.
Agredia fisicamente o pai. E verbalmente a mãe. Em “bailes se
relacionava com homens desconhecidos, se expondo a riscos”. Tinha apenas
13 anos. No dia 5 de agosto de 2014, chegou ao projeto Casa Viva, uma
instituição criada para cuidar de jovens usuários de drogas. Foge. Fora
apreendida após um pedido judicial de busca e apreensão. Atitudes
formais e legais foram tomadas. Mas, na prática, nada disso resolveu o
problema de X., o mesmo de milhares de jovens.
Casa onde aconteceu o crime era chamada de abatedouro Foto: Freelancer / Agência O Globo
—
Ela vem de um ambiente familiar muito adoecido. E desde cedo, sozinha,
criou as estratégias dela para sobreviver. Quem pode julgar o que está
certo ou errado? É uma infância violenta, apesar de estar em seio
familiar e ser criada em um bairro de classe média (Jacarepaguá) —
explica uma das funcionárias que atenderam X.. — Nós vivemos uma
sociedade machista. Ela é vítima e está sendo julgada. Que homens são
esses que a gente também está formando? Como são capazes dessa barbárie.
E as pessoas assistem ao vídeo e não se dão conta da perversidade? Eles
não tinham esse direito.
Durante anos, passo a passo, X. foi
soltando os laços com família e escola, apesar da luta da avó materna. E
submergiu num mundo paralelo. Em 2014, vivia no Morro da Serrinha, com
um “marido”. Ostentava roupas de grife e celulares de última geração.
Bonita, bem articulada, ela se recusava ao tratamento em uma casa de
acolhida.
— Foram apenas dois dias com ela, mas muito marcantes.
Fazíamos um trabalho de convencimento, persuasão. Ela estava muito
violenta. Agrediu o pai, pegou o bebê de qualquer jeito, ele acabou
ficando vulnerável. Queria fugir, depois aceitou. Mas no dia seguinte,
viu televisão, jantou, tudo como a rotina, mas depois não estava mais lá
— conta uma funcionária:
— A gente sente muita dor de imaginar o que aconteceu.
Manifestantes fizeram protesto em Brasília contra a cultura do estupro Foto: Agência O Globo
Vídeo
O
caso da menor estuprada veio à tona após um vídeo em que a adolescente
aparece nua e desacordada ser publicado nas redes sociais. Estupro
Nas
imagens, é possível ver dois homens manuseando o corpo da menor. Há
também selfies feitas por suspeitos com a adolescente nua.
Advogada
Inicialmente,
a jovem teve assistência jurídica da advogada Eloisa Samy Santiago. Ela
deixou o caso a pedido da família da adolescente, quando a menor passou
a integrar um programa federal de proteção a pessoas ameaçadas de
morte. Afastado
Após acusação da defesa da
jovem de que o delegado Alessandro Thiers insinuou que a culpa pelo
crime era da vítima, a Polícia Civil afastou-o da coordenação das
investigações.
Rai de Souza foi preso, acusado de participação no estupro Foto: Marcelo Theobald / Agência O Globo Convicção
A
delegada Cristina Bento assumiu as investigações, disse estar convicta
de que houve estupro e pediu a prisão de seis suspeitos.
A
internação compulsória de um menor de idade para tratamento só pode ser
realizado mediante decisão judicial. Especialistas consultados pelo
EXTRA apontam que o artigo 98 do Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA) abre essa possibilidade.
A delegada Cristiana Bento assumiu as investigações sobre o crime Foto: Guilherme Pinto / Agência O Globo
O
texto diz que “as medidas de proteção à criança e ao adolescente são
aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta lei (o ECA) forem
ameaçados ou violados em razão de sua conduta”. A interpretação é de
que, por isso, a família pode pedir a internação baseada em um lado
psicossocial atestando a necessidade do tratamento.
Esse pedido
pode ser feito no Plantão Judiciário (Av. Erasmo Braga 115, Centro) ou
através de advogados particulares ou da Defensoria Pública (Avenida
Marechal Câmara 314, Centro), que levará o caso ao Juizado da Infância e
da Juventude.
O Conselho Tutelar não tem poder para determinar
essa internação por uma decisão administrativa — já que a internação
pressupõe a privação de liberdade do adolescente.
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