
A votação ocorreu horas após um desfile militar patrocinado por Bolsonaro, que reuniu na manhã desta terça cerca de 40 veículos, todos da Marinha, entre blindados, caminhões e jipes.
A parada militar passou ao lado da praça dos Três Poderes, onde estão o Palácio do Planalto (sede do Executivo), o Congresso Nacional (Legislativo) e o Supremo Tribunal Federal (Judiciário).
Segundo o sistema da pesquisa da Câmara, a última vez em que o plenário rejeitou uma PEC integralmente foi em março de 2017 –a proposta que possibilitava universidades públicas cobrarem por cursos de extensão e de pós-graduação latu sensu. Foram 304 votos a favor da PEC à época, quatro a menos que o mínimo necessário.
Estatísticas oficiais da Casa mostram que nenhuma PEC foi rejeitada em 2018 e 2019. A reportagem pediu à Câmara um levantamento no final da tarde desta terça sobre 2020 e 2021, mas as informações não foram reunidas até a conclusão desta reportagem. Presidente da Câmara de 2016 até janeiro deste ano, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) disse que não houve nenhuma PEC rejeitada pelo plenário da Câmara em 2020 e 2021.
Nesta terça, apesar da convicção de líderes de que a PEC seria derrotada, dirigentes partidários tiveram de entrar em campo para manter votos contra a proposta após constatarem divisão em diversas bancadas.
Os deputados do PSD, por exemplo, pediram para votar como quisessem após reunião com o presidente da legenda, Gilberto Kassab. Embora Kassab tenha feito apelo para que eles se posicionassem contra a matéria, a bancada estava rachada. Na hora da votação, PSD orientou seus deputados a votar contra a PEC. Além dele, outros presidentes de partidos atuaram para evitar votos favoráveis à PEC.
O próprio presidente da Câmara, Arthur Lira, só colocou em votação a proposta quando teve a certeza de que a PEC seria rejeitada. Para isso, segundo deputados relataram à reportagem, ele próprio atuou para que parlamentares favoráveis ao texto não votassem.
Muitos deputados acabaram se posicionado publicamente para dar resposta às bases eleitorais e, nesta terça, decidiram não voltar atrás.
A votação desta terça teve Lira, que é aliado de Bolsonaro, como principal patrocinador. O parlamentar afirma ter obtido do presidente o compromisso de que ele irá respeitar o resultado desta terça e irá cessar os ataques ao sistema eleitoral e a ministros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral.
Seu argumento é o de que o assunto, pela proporção que tomou, precisava de uma decisão mais representativa do universo dos parlamentares.
Nos bastidores, membros das cúpulas dos Poderes negociam um prêmio de consolação ao bolsonarismo, que seria a adoção de uma medida administrativa ampliando o número de urnas eletrônicas que hoje são sorteadas para passarem por teste de integridade –atualmente cerca de 100 de um universo de cerca de 500 mil urnas eletrônicas.
O voto impresso serviu para reaglutinar a base bolsonarista, que andava dispersa, com sucessivas crises na CPI da Covid, Judiciário, e com a economia patinando. Assim, auxiliares acreditam que não apenas este tema deve continuar nos discursos de Bolsonaro, como pode também se tornar uma bandeira de campanha.
"A minha posição, que sempre foi favorável a uma possibilidade maior de auditoria do processo de votação no Brasil, permanece a mesma neste momento. Sou a favor da PEC 135/2019, que contou inclusive com a minha assinatura de apoiamento", disse o deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS).
Responsável jurídico pelo pedido de auditoria do resultado das eleições de 2014, quando o tucano Aécio Neves perdeu por uma margem estreita para a petista Dilma Rousseff, o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP) foi à tribuna se posicionar contra a proposta bolsonarista. "Nós não temos mais dúvida de que o sistema é seguro."
O voto em cédula no Brasil, com apurações lentas e conturbadas, que podiam durar dias, vigorou até 1994.
Na eleição municipal de 1996, a urna eletrônica começou a ser implantada nas maiores cidades do país.
Desde então, apesar de não haver nenhum indicativo ou suspeita concreta de fraude na votação eletrônica, o Congresso Nacional já aprovou em três ocasiões leis tentando implantar não a volta das cédulas, mas a impressão do voto dado na urna eletrônica –leis 10.408/2002, 12.034/2009 e 13.165/2015.
A segunda foi declarada inconstitucional pelo STF sob os argumentos de risco à garantia constitucional do sigilo do voto e violação aos princípios de economia e eficiência na gestão do dinheiro público.
Segundo estimativas, o custo para implantar o voto impresso em todo o país deve superar a casa dos R$ 2 bilhões.
A terceira lei também foi barrada pelo Supremo, sob o mesmo argumento: inconstitucionalidade.
Ainda na segunda (9), Bolsonaro começou a esboçar um discurso de derrota. Ele atribuiu a uma interferência do ministro Luís Roberto Barroso, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), as chances de a proposta não vingar na Câmara.
"Se não tivermos uma negociação antes, um acordo, vai ser derrotada a proposta. Porque o ministro Barroso apavorou alguns parlamentares, e tem parlamentar que deve alguma coisa na Justiça, deve no Supremo. Então o Barroso apavorou", disse o presidente, em entrevista a uma rádio bolsonarista.
Depois, disse a apoiadores que tem "outros mecanismos" para "colaborar para que não haja suspeita".
Na mesma segunda, ministros do TSE encaminharam ao STF uma notícia-crime para investigar o presidente Jair Bolsonaro e o deputado federal Filipe Barros (PSL-PR) por suspeita de divulgação de dados sigilosos contidos no inquérito da Polícia Federal que apura um ataque hacker sofrido pela corte em 2018.
Bolsonaro fez a publicação após afirmar em programa da rádio Jovem Pan que comprovaria a fraude nas urnas eletrônicas. Um dia depois, a corte eleitoral desmentiu o presidente e disse que o episódio, que ocorreu em 2018, "embora objeto de inquérito sigiloso, não se trata de informação nova".
Segundo o tribunal, "o acesso indevido, objeto de investigação, não representou qualquer risco à integridade das eleições de 2018. Isso porque o código-fonte dos programas utilizados passa por sucessivas verificações e testes, aptos a identificar qualquer alteração ou manipulação. Nada de anormal ocorreu".
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